Conteúdos atitudinais: Como as práticas pedagógicas e a inserção de conteúdos atitudinais interferem no aprendizado do aluno



INTRODUÇÃO

            Após ter trabalhado dez anos na área administrativa/financeira, me especializado na área por  meio de cursos (Técnico administrativo, Técnico Contábil, administração de pessoal, técnicas financeiras, entre outros), tive a  oportunidade de ingressar na área educacional por meio de processo seletivo na Prefeitura de Campinas e atuar junto à  Educação Infantil.
            Esta experiência sinalizou-me outras perspectivas no campo profissional. Permaneci na área em vários segmentos: Escolas particulares, pública e ONG atendendo crianças de 0 a 8 anos, estas últimas  já cursando Pedagogia na PUC-Campinas.
            Na Universidade tive a oportunidade de ingressar no projeto de  Iniciação Científica. Durante a primeira etapa de levantamento de dados do projeto deparei-me com questões levantadas por mim, internamente, quanto a questões de atitudes relacionadas ao aprendizado que permeavam o projeto, e estas questões levaram-me a optar por dissertar sobre o tema da pesquisa: Conteúdos Atitudinais.
            Outro fator anterior à Iniciação Científica, foram os estágios realizados junto à Educação Infantil e Ensino Fundamental A e B, algumas posturas chamaram-me atenção diante do aprendizado destes alunos entre elas  a  do docente em relação a valores.
            Ao aplicar os conteúdos, mediar situações de conflitos pessoais e coletivos, esses profissionais demonstraram a transferência de valores morais, atitudinais, posturais que as crianças agregaram às suas práticas e influenciam seu caminhar no aprendizado, com mais postura, autonomia, amadurecimento, colaboração, entre outros.
            Aliada a essas observações, leituras sobre o tema despertaram-me interesse em saber como essas relações se dão e inferem no aprendizado.
            Este trabalho de conclusão de curso tem a intenção de demonstrar de que forma os Conteúdos Atitudinais interferem no aprendizado dos alunos, através de pesquisa bibliográfica que fundamenta este trabalho, pesquisa empírica em escola de Ensino Fundamental (séries iniciais) e análise de documentos.

Capítulo 1 – Conteúdos Atitudinais: fundamentos e seu enlace pedagógico atual
            Este capítulo apresenta os conceitos de moral e ética, como estes se relacionam com os conteúdos atitudinais (que compreendem valores, normas e atitudes) e como se dá a construção deste arcabouço de comportamentos intrinsecamente relacionados ao aprendizado de conteúdos escolares

1.1 – Ética como princípio dos conteúdos atitudinais
Pensadores como Platão e Aristóteles já falavam da excelência moral,  ética , valores,  associados aos comportamentos humanos e vinculados às relações interpessoais e de aprendizado.
Aristóteles (1992, p. 35) afirma que “As coisas que temos de aprender antes de fazer, aprendemo-las fazendo-as (...) Tornamo-nos justos praticando atos justos (...)”. Nas relações de aprendizado aplica-se este conceito, a criança só pode ler, lendo, escrever, escrevendo, respeitar, sendo respeitada.
A Excelência moral é constituída, por natureza, de modo a ser destruída pela deficiência e pelo excesso, tal como vemos acontecer com o vigor e a saúde (temos que explicar o invisível recorrendo à evidencia do visível); os exercícios excessivos ou deficientes destroem igualmente o vigor, e de maneira idêntica as bebidas e os alimentos de mais ou de menos destroem a saúde, ao passo que seu uso em proporções adequadas  produz, aumenta e conserva aquele e esta. Acontece o mesmo com a moderação, a coragem e outras formas de excelência moral. O homem que evita e teme tudo e não enfrenta coisa nenhuma  torna-se um covarde; em contraste, o homem que nada teme e enfrenta tudo torna-se temerário (ARISTÓTELES, 1992, p.37).

Os valores construídos nos ambientes educacionais colaboram de forma efetiva com o aprendizado, porém conforme a indicação de Aristóteles (1992), em tudo há de se praticar a moderação, o aluno que é cobrado enfadonhamente por sua postura, conduta, sendo exigido comportamento e desempenho exemplar, não alcançará com total êxito o cumprimento dessas atividades.
Isso dever-se-á ao fato  da exigência em excesso, demasiada, enquanto que o aluno deixado à vontade para produzir exclusivamente de acordo com seu tempo, sem exigências de condutas e procedimentos não alcançará seus objetivos necessários pela falta de exigência.
Essas afirmações nos remetem a refletir ser impossível alcançar o ideário meio termo, mas por meio das vivências mediadas e atentas dos alunos podemos aprimorar suas ações voltadas para posturas de aprendizagem.
Com efeito a excelência moral se relaciona com  o prazer e o sofrimento; é por causa do prazer que praticamos más ações, e é por causa do sofrimento que deixamos de praticar ações nobilitantes. Daí a importância, assinalada por Platão , de termos sido habituados  adequadamente, desde a infância, a gostar e desgostar das coisas certas; esta é a verdadeira educação. (ARISTÓTELES, 1992, p.37).

Esse gostar e desgostar transferido aos dias atuais pode ser tratado em sala de aula por meio dos conceitos transversais[1], que englobam, respeito, valores, entre outros, que praticados coletivamente influenciam de forma positiva nas resignificações no processo evolutivo de relacionamento e aprendizagem. 
Um desafio a ser vencido pelo docente é de transpor o antagonismo entre o dever e o interesse advindos de seus alunos, os mesmos vivem um dilema que deve ser mediado cautelosamente, em torno das ações de acordo com seus interesses e as ações  de acordo com seus princípios.
 John Dewey, filósofo norte-americano que influenciou educadores de várias partes do mundo, e que no Brasil inspirou o movimento da Escola Nova, ao colocar a atividade prática e a democracia como importantes ingredientes da educação, sendo o nome mais célebre da corrente filosófica que ficou conhecida como pragmatismo, embora ele preferisse o nome instrumentalismo, pois para essa escola de pensamento, as idéias só têm importância desde que sirvam de instrumento para a resolução de problemas reais. No campo específico da pedagogia, a teoria de Dewey se inscreve na chamada educação progressiva. Um de seus principais objetivos é educar a criança como um todo. O que importa é o crescimento como todo: físico, emocional e intelectual. 
Segundo Dewey (1959, p.385),
 Proceder de acordo com os princípios é proceder desinteressadamente, em obediência a uma lei geral superior a todas as considerações pessoais. Proceder de acordo com o interesse é, segundo se alega, proceder egoisticamente, tendo em vista, unicamente, vantagens pessoais.

Os alunos dos anos iniciais do Ensino fundamental estão no início de suas vidas escolares, vem carregados de valores familiares e da sociedade que lhes  foram incutidos, valores estes, que muitas vezes precisam de adequação ao ambiente escolar, não atendendo apenas às seus interesses e sim aos  interesses coletivos de aprendizado, sua postura individualista, e muitas vezes até sua postura física necessitam da mediação para agir de acordo com os princípios da escolaridade.
“O princípio não é aquilo que justifica uma atividade, e sim, é apenas outro nome para a continuidade do trabalho”.(DEWEY, 1959, p.388)
Acredita-se que a moral,  é um elemento totalmente à parte da educação, dissociada, transmitida pelas interações que o indivíduo sofreu, até seu ingresso ao ambiente escolar, que a mesma possui uma faceta “biológica”, inata ao ser humano, e não uma construção apenas nos anos iniciais da vida de qualquer indivíduo, mas constante, mediada, direcionada, exercitada. Dewey articula a moral à inteligência no âmbito escolar, afirmando que os ensinamentos de moral estão intrinsecamente relacionados ao aprendizado, ao desenvolvimento de atividades de baixa, média e alta complexidade, sendo de fundamental importância o ensinamento de educação moral.
Para o autor lições de “moral” significam, o ensino daquilo que outras  pessoas pensam sobre a virtude  e o dever. E estes só terão valor se o ambiente propiciar respeito às opiniões e vivências dos alunos, caso contrário os ensinamentos tornam o dever apenas servio, sem significação para a educação.
O autor ainda  aponta que,
O mais importante problema da educação moral nas escolas diz respeito às relações entre o conhecimento e a conduta. Pois se o ensino recebido num curso regular não influenciar o caráter, será inútil conceber-se o fim moral como o fim unificador e culminante da educação. (DEWYE, 1959, p.395-396)

Demonstrando que a educação moral deve agir de forma integral, ser contemplada não apenas como forma de inserção social, mas como aprimoramento humano constante no processo de construção e desconstrução dialética de desenvolvimento humano, sendo componente fundamental à agregação de saberes escolares e de vida.

1.2- Construção e aplicação dos conteúdos
Os conteúdos atitudinais relacionam-se com a construção de valores, atitudes e normas e notadamente com questões que envolvem  a disciplina na escola (BRASIL, 1998).
As atividades voltadas ao aprendizado de conteúdos escolares associadas aos conteúdos atitudinais apresentam diferenças de compreensão e apreendimento pelos alunos, pois os conteúdos inseridos de forma intencional nestas atividades e direcionados pelo professor disparam elementos que encaminham à reflexão, à mudança de postura de aprendizagem e ao  efetivo respeito aos ensinamentos, a quem os ministra e a quem é ensinado, trazendo significação ao aprendizado.
Os conteúdos atitudinais, conceituais e procedimentais são a construção ativa da capacidade intelectual para operar símbolos, imagens, ideias e representação a que venham organizar as realidades. Aprender conceitos permitem atribuir significados aos conteúdos aprendidos e relacioná-los a outros. (BRASIL, 1998).
Dada a complexidade dos processos de aprendizagem de valores e atitudes nota-se a dificuldade que educadores apresentam em desenvolver “uma prática constante, coerente e sistemática, em que valores e atitudes almejados sejam expressos no relacionamento entre as pessoas e na escolha dos assuntos a serem tratados” (BRASIL, 1998). Ao tratar do aprendizado dos conteúdos atitudinais deve-se considerar a cultura, os valores e atitudes que são valorizados pela comunidade a qual o aluno pertence.
Valores, atitudes e normas são componentes essenciais ao entendimento da designação dos Conteúdos Atitudinais.
As normas todos aprendem desde muito cedo, normalmente são aplicadas logo no início da vida como hora de dormir, de se alimentar, entre outros, sendo normalmente estabelecida pelos pais e as crianças logo aprendem como funcionam, estas normas regem seus comportamentos inicialmente. Junto às normas as crianças adquirem também os valores, que podemos definir como o que a sociedade considera bom ou ruim.
As atitudes estão relacionadas com as formas de agir, que geralmente são estáveis. É importante ressaltar que estes aspectos estão intimamente relacionados e “têm em comum que cada um deles está configurado por componentes cognitivos (conhecimentos e crenças), afetivos (sentimentos e preferências) e condutuais (ações e declarações de intenção)” (ZABALA, 1998, p. 47).
O aprendizado é dado a partir do conhecimento pré-existente que quando “provocado” com novas informações sofre um desequilíbrio (SOLÉ IN COLL, 1999) neste momento os conteúdos atitudinais podem servir como apoio ao reequilíbrio da formação deste novo conhecimento.
O aluno necessita de aprendizagem significativa para agregar saberes, o aluno deve manifestar disposição para a aprendizagem, compreendendo o significado do que estudam, relacionando com conhecimentos prévios (ENTWISTLE, 1998 APUD COLL, 1999).
Esse enfoque de aprendizagem foi classificado de profundo pelo autor que também destaca outro enfoque classificado de superficial, que é descrito  como aquele que se tem intenção de cumprir o dever ou prever o que o professor perguntará sobre o conteúdo, não aprofundando-se a ele, memorizando com ausência de reflexão sobre o mesmo.
O que aparentemente leva o aluno às duas condutas é a forma como as aulas são conduzidas.
”Parece haver acordo em conceder ao interesse pelo conteúdo as características da tarefa proposta e aos requisitos da avaliação um papel primordial no enfoque com o qual o estudo é abordado” (SOLÉ IN COLL,1999 p. 35).
Se o aluno não reconhece o propósito da atividade não terá a oportunidade desenvolvimento com a mesma, não desenvolvendo autonomia e criando dependência com relação às orientações vindas do professor, que ao explicar minuciosamente as tarefas não propicia a reflexão do aluno perante ao conteúdo.
Porém, para fazer uso do enfoque profundo há necessidade de um longo caminho a se percorrer, não podemos exigir dos alunos que se aprofundem, relacionem o novo conteúdo aos pré existentes, assimile e faça sua catarse, é vagaroso e processual, esse, exigido de forma imediata levará o aluno ao enfoque superficial.
As questões afetivas e morais constituem de forma relevante parte significativa do aprendizado dos alunos, e seus professores devem analisar cautelosamente suas ações em prol deste aprendizado significativo.
O Capítulo 2 traz as atitudes no ambiente escolar relacionadas ao aprendizado, as condutas adotadas pelos professores e como são recebidas pelas crianças. São apontados os comportamentos pró e anti-sociais e suas implicações no ensino e na aprendizagem relacionados às atitudes adquiridas e ensinadas.




[1] Os temas transversais são constituídos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN's) e compreendem seis áreas: Ética (Respeito Mútuo, Justiça, Diálogo, Solidariedade), relações de gênero, Meio Ambiente, Saúde, Pluralidade Cultural, Pluralidade.


REFERÊNCIAS


ABBAGNANO, Nicola, Dicionário de filosofia, Ed. Fondo de Cultura

ARISTÓTELES, tradução do grego, introdução e notas de Mario da Gama Kury. Ética a Nicomacos.2. Ed. Brasília, DF: Edunb, 1992 

ASSIS, Orly Zucatto Mantovani. Desenvolvimento Moral e Educação. Campinas, 2003

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BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEE, 1998, v. 1.

MAURI, T. O que faz com que o aluno e a aluna aprendam os conteúdos escolares. In COLL, C.  et al. O construtivismo na sala de aula. Editora Ática, 1999. p. 79-122.

DEWEY, John. Democracia e educação: Introdução a filosofia da educação. São Paulo, SP: Comp. Ed. Nacional, 1959

SOLÉ, I.Disponibilidade para a aprendizagem e sentido da aprendizagem. In COLL, C. ET AL. O Construtivismo em sala de aula. Editora Ática, 1999. P.29-54

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